Abrigo no metrô em madrugada fria mostra que ainda existe amor em SP 2z735e
Subsolo de estação é aberto para receber pessoas em situação de rua sem burocracia, sempre que temperatura cai a 10 graus 72s2p
Com camas, comida e acolhimento, espaço recebe cem pessoas para pernoite e fornece até ração para os cachorros de quem está em situação de rua. Facilidade de usar o serviço e localização central atraem. A maioria são homens sozinhos, que raramente dão problema.
O rapper Criolo imortalizou o refrão “não existe amor em SP”, mas até ele concordaria que não é bem assim, pelo menos na estação Pedro II, do metrô da capital. Ela abriga pessoas em situação de rua sempre que a temperatura cai a 10 graus, ou menos, como aconteceu na madrugada de 14 de junho. yl66
“A gente só não quer que eles durmam na rua”, diz uma integrante da Defesa Civil, entidade que organiza o acolhimento temporário. “Aqui é para chegar, entrar, comer e dormir com dignidade”, completa uma mulher que conhece muito a vida nas ruas em dias de frio.
O pessoal ao redor da estação sabe que, caindo a temperatura, a partir de 19 horas o o é liberado, até meia-noite. É só dar o nome na entrada, sem mostrar documento, nem fazer cadastro. Pegam quentinhas, água, ração para os cachorros, usam o banheiro e, se quiserem, podem ficar para dormir – cerca de cem pernoitam.
O abrigo, discreto, funciona no enorme subsolo da estação Pedro II. É mais quente que a área de embarque. Há cobertores e colchões novos nas camas de campanha. Cachorros podem dormir junto. Dá a impressão de que cabem três, quatro vezes mais pessoas.
Quem vem para o abrigo? 4dir
Apesar de pouco burocratizado, os dados de atendimento são anotados diarimente. Os homens constituem a grande maioria. Em seguida famílias, mulheres e a população LGBTQIAPN+. Quem vem para dormir, chega logo que o abrigo abre. São pessoas com fome, querem comer e ir para a cama.
As conversas com o pessoal que trabalha no atendimento e com os frequentadores mostram que problemas familiares – e muita desilusão amorsa – são os grandes motivos para os homens sairem de casa. Sinésio Manuel dos Santos, baiano de 46 anos, conversa com a reportagem, e suas muitas histórias são invariavelmente pontuadas pela lembrança da ex-mulher.
A família é de São Desidério, interior da Bahia. Sinésio casou aos 18 anos, “era quase um menino”. Teve três filhas, queria ter mais, a mulher operou. Sinésio tem uma vida de viagens a trabalho ficando meses fora de casa. Correu Mato Grosso, Goiás, interior de São Paulo e capital. “São muitas lutas, mas também muitas vitórias”, diz o baino conversador.
Como a realidade é contraditória, complexa e variada, chega gente de todo tipo. Pessoas que ariam despercedibas pela estação, com roupas e aparência comuns; gente que vem descalça; casais que preferem não se identificar. Raramente dão problema, dizem os seguranças da estação.
Último que chega faz questão de mostrar o documento 4a6072
Converso com um casal na faixa dos 30 anos de idade. Eles preferem o abrigo ao albergue. Vieram pegar comida. Ela tem um filho de 15 anos, morando com a avó. Ele rói as unhas durante a entrevista, não diz nada.
Vem gente que só quer água, outro pergunta se pode chamar o primo. Um dos últimos a chegar é Anderson Gabriel de Oliveira. Casado, duas filhas, está com a família do lado de fora. Ele é de Suzano, na Grande São Paulo, ficou desempregado e enfrentou o despejo. Pega dois cobertores e uma quentinha, sai da estação.
Por volta de 23h30, quase todo mundo do pernoite está nas camas, em espaços separados para homens, mulheres, famílias, pessoas com pets. Ainda chega gente, um casal pede água. Guardas da estação encostam. Quando tem abrigo, duas duplas am a noite na Pedro II.
O último homem que chega faz questão de mostrar o documento. Veste uma calça da Prefeitura de São Paulo. Pergunto se ele trabalha lá. “Gostaria”, responde seco e entra. A estação fecha. Quem chegou, escapa do relento. Na manhã seguinte, quem quiser sai com um tiquet para tomar café.